Escritores negros (lll)

Policarpo Quaresmo, personagem protagonista do livro de Lima Barreto era um visionário que sonhava com um Brasil puro. Entre uma agrura e outra, elabora uma petição ao então presidente Floriano Peixoto para que se instalasse a língua Tupi-Guarani como oficial. Lógico que Floriano nem deu bola para o insano. E o que mais chama a atenção é que até meados do século dezoito a língua falada pelo povão era o “nheengatu”, misto de Tupi-guarani com algumas palavras em português, proibida e perseguida pelos portugueses para que o idioma de Camões aqui proliferasse sem intromissões.   Melhor mesmo é ler o livro. E ao contrário de seu personagem de “O Triste Fim de Policarpo Quaresma”, a insanidade de Lima Barreto estava em tecer observações sobre a sociedade da época, carregada pelo racismo, machismo e outros ismos presentes até hoje em nosso meio. Como todos os outros negros que se meteram a intelectuais ou até mesmo ao absurdo de publicar livros, Lima Barreto sofreu com o preconceito racial. Morre a mãe quando tinha seis anos de idade. Poucos anos depois quando estudava no Instituto Politécnico do Rio de Janeiro, o pai morre acometido pela insanidade mental. O Brasil não estava preparado para lidar com a loucura, isso até bem pouco tempo. Lugar de louco era ir para Barbacena, ou melhor, morrer em Barbacena. A morte do pai o obriga a largar o curso de Engenharia para poder cuidar da família. O Brasil perde um engenheiro, mas ganha um escritor contundente. Amanuense da secretaria da guerra efetivo, segue escrevendo crônicas e provocando algumas personalidades daquela sociedade.  Provocações que lhe renderam o descaso e  a rejeição por seus escritos. Descaso e rejeição que o levaram ao alcoolismo e pelo histórico familiar a internações em um hospício. Exclusão social que não engessou sua mão. Continuou escrevendo. “Não é só a morte que iguala a gente. O crime, a doença e a loucura também acabam com as diferenças que a gente inventa.” Affonso Henrique de Lima Barreto é considerado um dos pré-modernistas que ironicamente morre em novembro de 1922, ano da primeira Semana de Arte Moderna. Que era criticado pelo estilo livre de escrever, estilo enaltecido e defendido pelos modernistas. Estudar Lima Barreto é mais do que entender essa ou aquela escola literária, é aprofundar-se e conhecer os meandros de um país preconceituoso que escreve sempre uma história que possa agradar a todos, mesmo que tenha que dourar a pílula relegando aqueles que fizeram o que de fato foi. “Brasil não tem povo, tem público.” Dita por um negro, pobre e louco há cem anos, essa frase soa como um triste alerta de que nesse tempo todo, as mudanças que promovemos foram tão poucas que beiram a insignificância. geraldocharles@hotmail.com 

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