Climatizadores podem causar danos a pinturas no Santuário

Flávio Flora

O sistema de climatização do Santuário de Santo Antônio, em Divinópolis, foi instalado às pressas, mas, por causa da umidade que supostamente produzirá, a médio prazo, pode oferecer riscos aos afrescos internos do templo. Na sexta-feira passada, 10, a reportagem acompanhou uma visita técnica de membros do Conselho do Patrimônio Histórico, Artístico e Paisagístico de Divinópolis (Conphap) ao local para pré-avaliar os efeitos dos aparelhos, mas estes já haviam sido instalados e funcionavam em teste. Estavam presentes, a jornalista Sonia Terra (presidente), a historiadora Karine Mileib (secretária) e o arquiteto João Batista Rodrigues (consultor), da Secretaria Municipal de Cultura, responsáveis pelo Conselho (foto).

O arquiteto João Batista chamou a atenção para uma possibilidade de “concentração de líquido nas paredes”, provocada pelo funcionamento do sistema. Ele enfatiza características do equipamento e dos seus efeitos, com base nas informações técnicas prestadas pelo próprio fabricante e em estudos científicos afins. Trata-se de um potente umidificador de ar que pode, a médio prazo (um ano ou menos), “produzir mofo” nas pinturas.

Incertezas técnicas

A presidente do Comphap manifestou sua estranheza em relação às mudanças “aceleradas” não comunicadas oficialmente, como era esperado. Segundo Sonia Terra, existem “incertezas técnicas” que podem “comprometer a conservação e a integridade das preciosas pinturas internas”, ressalta.

A secretária Karine Mileib confirmou que o Comphap não recebeu qualquer informação prévia a respeito:

— Toda mudança ou alteração que vai ser feita, o Conselho é comunicado ou consultado; há trocas de ofícios e pareceres, em situações anteriores; mas, desta vez isso não aconteceu — revelou Mileib.

A secretaria Municipal de Cultura, da qual faz parte a Gerência de Patrimônio e o Comphap, também não receberam “nenhum tipo de notificação, contato ou consulta, formal ou informal, acerca destas intervenções”, conforme apurou a reportagem do Agora.

Aparelhos já funcionam

A reportagem ouviu, por telefone, o diretor voluntário do Centro Administrativo da Paróquia de Santo Antônio, professor Anísio Fonseca de Azevedo, responsável pela implantação dos climatizadores, e soube dele que os equipamentos instalados “não oferecem risco para as pinturas” porque não são por aspersão, que “cria uma névoa de água para refrescar o ambiente e é indicado para uso ao ar livre”.

— Após diversos estudos, optamos por instalar no Santuário, o climatizador evaporativo, que não lança gotas de água junto com o ar, uma vez que a água é utilizada para umedecer colmeias de celulose que se localizam atrás da hélice. Com certeza, neste processo, o climatizador resfria e também umidifica o ambiente, porém sem promover a saturação do ar que ali se encontra — detalha Anísio Azevedo. No entendimento do professor, “sem saturação do ar com umidade, não haverá dano”

Informado de que há estudos que comprovam que climatizadores umidificadores produzem umidade cumulativa, o professor Anísio informou que também tem um parecer técnico que afasta essa “suposição”. Disse também que não tomaria uma decisão dessas se o sistema viesse oferecer perigo para as pinturas internas do Santuário.

Questionado sobre o andamento rápido das obras, Anísio disse que elas ocorreram em ritmo normal, com as instalações concluídas no último fim de semana. Lá foram instaladas cinco máquinas, com o custo final de R$ 60 mil – equipamentos custaram R$ 50 mil) e estão em perfeito funcionamento.

Resposta  demorada

A pedido do secretário municipal de Cultura, Osvaldo André de Mello, assim que foi observado o início das obras, na terça-feira,7, o arquiteto João Batista produziu um relatório técnico, que foi encaminhado à promotoria de Patrimônio Público. A representação objetivava a “interrupção imediata da instalação do sistema proposto, até que se defina, com segurança, as reais implicações desta climatização”, pedido que até ontem à tarde ainda estava pendente.

Nesse relatório, é indicada uma descaracterização relevante nas linhas originais do edifício, que altera significativamente a aparência da fachada da esquerda, voltada para o Centro Administrativo:

— Além desta intervenção, ainda existe um risco, ainda não devidamente definido tecnicamente, de comprometimento da conservação e da integridade das pinturas murais, em função da eventual insuflação de ar úmido no ambiente e do gradiente térmico estabelecido entre as faces externa e interna das paredes suporte das pinturas. Esta diferença de temperatura poderá ocasionar movimentos de dilatação diferenciada na alvenaria, com consequentes efeitos negativos nos bens tombados” – registra o relatório.

Bem histórico inestimável

Na representação, o secretário Osvaldo André solicita ao promotor que essas obras recebam uma avaliação idônea do Comphap “que tem habilitação legal para apreciar o caso, considerando-se a descaracterização evidente do edifício, de valor histórico, arquitetônico e cultural inestimável, em função da instalação do conjunto climatizador”.

As pinturas murais (em têmpera a caseína) presentes nas paredes laterais da nave principal, no altar-mor e nas paredes do coro do templo são tombadas através da Lei Municipal 2.459, de 15/12/1988, estando, portanto protegidas de qualquer natureza de alteração, dano ou descaracterização, conforme legislação federal em vigor. Elas foram inauguradas em 20/11/1949, sendo a maior obra artística de Divinópolis, inscrita no patrimônio artístico nacional.

 

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