Humilhação: professora cadeirante precisa ser carregada para votar em escola

 

Bruno Bueno

A professora Isabel Cristina Soares, portadora de deficiência e cadeirante, passou por um momento difícil na votação do primeiro turno das eleições. Em entrevista exclusiva ao Agora nesta semana, relatou que sua seção não possuía acessibilidade adequada. 

Ela precisou ser carregada por policiais que foram chamados ao local. Durante o trajeto, machucou o pé. Humilhada, a vítima promete entrar na Justiça. O Cartório Eleitoral, por sua vez, reconheceu a falta de acessibilidade, mas disse que não houve solicitação para troca de seção.

Entenda

A ocorrência, segundo relato da vítima, aconteceu na Escola Estadual Antônio Gonçalves de Matos. À reportagem, ela contou que chegou no local nas primeiras horas do dia.

— Eu saí de casa sem meus aparelhos, porque achei que fosse uma coisa rápida. Cheguei na escola e vi que o alto elevado já dava uma melhorada. Não precisei usar o calçamento. Mas, no final da escola não tem rampa. Pedi ajuda e fui diretamente para minha sala de votação. Estava um tumulto danado — relata.

Ela admite que recebeu orientações de que não havia feito a transferência de seção.

— Falaram que minha seção tinha mudado. Eu chamei a Comissão de Acessibilidade e eles entraram em contato com o Cartório Eleitoral. Disseram que eu não tinha feito a transferência, mas na eleição passada eu votei nesta seção — conta.

 

Filmagem

 

Constrangida pela situação, Isabel precisou ser carregada e tentou filmar o ocorrido. 

— Sem telefone, pedi um aparelho para a amiga da minha sobrinha que estava lá. Queria filmar para mostrar que meu direito de cidadã estava sendo cortado. O coordenador disse que não queria se expor. Falou que tinha um irmão com deficiência e que sabia das dificuldades. Por fim, disse que eu podia chamar a polícia. Foi o que eu fiz — explica.

Com o apoio dos policiais, a professora conseguiu subir as escadas e chegar ao local de votação. Contudo, sofreu um acidente no percurso.

— Os policiais falaram com os responsáveis e me perguntaram o que eu queria fazer. Disse que fui para exercer o meu direito. Eles queriam carregar minha cadeira, mas não era possível pois ela é pesada. Me passaram para outra cadeira e, com ajuda do responsável pela acessibilidade e de outro senhor, subiram na escada. Meu pé bateu e está inchado até hoje — acrescenta.

‘Humilhante’

Após votar, Isabel explicou a situação para os mesários e relatou sua indignação com o ocorrido.

— Votei. Foi difícil. É muito humilhante. Estou nessa briga desde quando me tornei PCD. Comentei com os mesários para fazer essa notificação. Na volta foi pior ainda porque meu pé estava doendo. Os policiais me ajudaram e pediram para aguardar o boletim de ocorrência — opina.

Emocionada, ela conta que procurou o Ministério Público (MP), após o ocorrido.

— Chorei o dia inteiro. É uma humilhação muito grande. Fiquei sabendo de outros amigos de grupo que passaram pela mesma situação. Fui ao Ministério Público e conversei com os responsáveis. Eles solicitaram ao Cartório para ser feita a mudança e no dia 8 de novembro ver o que pode ser feito para eleições futuras — afirma.

Por fim, garantiu que irá entrar na Justiça.

— Nós vamos abrir uma ação. Estamos olhando nas três esferas para que não só eu,  mas outros PCDs não passem pela mesma situação. Isso também pode acontecer com idosas, gestantes e pessoas temporárias. A sequela está no meu pé — finaliza.

Cartório

A chefe da 103ª Zona Eleitoral do Cartório Eleitoral e responsável pela seção, Cíntia Greco, deu sua versão dos fatos para a reportagem.

— O coordenador entrou em contato com o Cartório Eleitoral e (…) ofereceu para carregá-la até o local de votação. Segundo o profissional, ele parou de levá-la pois ela queria filmar a situação e ele se recusou — afirma.

Segundo ela, a professora recebeu todos os cuidados necessários pelos policiais.

— Depois disso ela chamou os policiais e fez um Boletim de Ocorrência. A partir disso, instauramos um processo administrativo. Isabel foi carregada pelos policiais que cuidaram da situação — disse.

 

Problema

 

Cíntia reconhece a falta de acessibilidade no local, mas afirma que a mulher já havia sido orientada em outras eleições a fazer uma transferência para um local com condições favoráveis.

— Isso realmente é um problema, porque a maioria dos locais não possuem condições. Vários outros eleitores passam pela mesma situação. (…) A Justiça Eleitoral não tem orçamento para injetar nesses locais de votação para que seja feita a acessibilidade — pontua.

A situação deve ser normalizada para a votação do dia 30. 

— Para o segundo turno nós instauramos o processo administrativo a partir do requerimento dela. Conversamos com a diretoria da escola sobre a possibilidade de colocar a seção dela,  que não é especial, em um local de fácil acesso. Vamos entrar em contato com o coordenador do local de votação — ressalta.

Boletim

O Agora teve acesso com exclusividade ao BO  lavrado no local de votação.

— Comparecemos na E.E. Antônio da Costa Pereira onde a solicitante/eleitora “Isabel Cristina Soares” da Zona 103, seção 150, nos relatou que é cadeirante e sua seção de votação está localizada no 2º andar da escola a qual não tem acessibilidade (rampa/elevador) para o exercício do direito de voto  (…) — consta um trecho.

O documento também relata o contato feito pelos policiais ao Cartório Eleitoral.

— Segundo a solicitante, nas eleições de 2018 sua seção estava localizada no andar térreo da escola. Após contato com a Justiça Eleitoral fomos informados que o eleitor deve comunicar previamente sua condição para que seja adequado o local de votação (…) — prossegue.

Por fim, o boletim descreve a resolução do caso.

— Foi autorizado que o coordenador S.D.C juntamente com um voluntário conduzissem a solicitante até o local de votação, sendo realizado assim seu direito pleno de voto. A eleitora foi orientada a regularizar sua situação no Cartório Eleitoral — finaliza.

 

 

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